Já existe missa árabe, missa afro, missa
sertaneja e missa gauchesca
As decisões do Concílio Vaticano II (1962-1965) geraram uma divisão dentro da Igreja Católica Romana. Embora alguns alegassem o abandono da tradição, com missas em latim e o sacerdote de costas para o povo, outras acreditavam que era hora de uma “abertura”. Mais tarde, com o avanço dos evangélicos e a considerável diminuição na frequência das missas por parte dos católicos, muitas foram às inovações.
Nem só das músicas e coreografias de padres como Marcelo Rossi e Fábio de Melo vive a Igreja Católica brasileira. Já existem celebrações com elementos culturais típicos de uma região ou grupo de pessoas. Surgiram assim missas tão diferentes como latina, gauchesca, afro, árabe e até sertaneja. “Na verdade, a eucaristia e os sacramentos são os mesmos. Todas essas celebrações fazem parte do que se convencionou chamar ritos litúrgicos ocidentais da Igreja Católica. Apenas foram feitas adaptações, de acordo com as peculiaridades de cada região ou grupo” explica Antônio Aparecido Pereira, da Arquidiocese de São Paulo.
Há missas bem tradicionais, que fazem o fiel se sentir em alguma catedral da Idade Média. Na Paróquia São Paulo Apóstolo, na capital paulista, é possível ver no altar o padre Aldo de costas para os fiéis, em direção ao Oriente, anunciando o evangelho em latim. Essa missa segue o chamado “antigo Rito Romano”. O padre usa inclusive as vestimentas medievais típicas. Além da batina preta, o padre usa uma túnica branca por cima e uma estola sobre o pescoço.
Com o consentimento do Vaticano e a orientação do bispo ela é celebrada uma vez por semana. Essas missas foram autorizadas em 2007 pelo Papa Bento XVI numa tentativa de reaproximar os católicos insatisfeitos com as reformulações propostas pelo Concílio Vaticano II.
No sul do Brasil, há muito que já é comum a chamada “missas crioulas”, que foram idealizadas pelo padre Paulo Murab Aripe e tiveram início nos Centros de Tradição Gaúcha (os CTGs). As celebrações utilizam símbolos da cultura gauchesca e inclusive expressões típicas foram incorporadas às homilias. Cuia de chimarrão, espeto de churrasco e lampiões ornamentam o altar.
Os cânticos são entoados no ritmo dos violeiros, e quase todos os fiéis trajam bombachas e botinas, enquanto as mulheres usam os vestidos característicos.
Adriano Rizzi, responsável pelo CGT Capitão Ribeiro, na cidade de Capitão, Rio Grande do Sul, explica como acontece a missa no galpão: “Há sete anos introduzimos a ‘missa crioula’ às celebrações do CTG e, a cada vez, um novo elemento é apresentado. Certo dia, por exemplo, o padre dispensou o sermão e pediu para algum voluntário declamar o texto de um poeta da região”,
Em São João de Meriti, perto da capital do Rio de Janeiro, as missas conduzidas pelo Frei Athaylton Jorge Monteiro Belo, o frei Tatá, usam o atabaque para ditar o ritmo da celebração. Na Paróquia de São João Batista, o instrumento de percussão que muitas vezes foi associado à umbanda e ao candomblé é ponto central da missa. Além da música animada, as cores vibrantes das roupas e colares dos fiéis são características marcantes da missa afro. Durante o ofertório, as mulheres dançam ao som dos tamborins com cestas de frutas, legumes e pães, que são divididas por todos no final do ritual.
Frei Tatá explica “A missa afro ganhou força no Brasil na preparação da campanha da fraternidade sobre o sobre o negro, em 1988 [Centenário da Abolição da Escravatura]. Quando vim pra cá em 1997, ela já havia sido consolidada por frei David Raimundo dos Santos, da Educafro, que envolveu padres, religiosos e leigos da América Latina e Caribe, com alguns teólogos ligados à teologia da libertação”, explica.
Já os imigrantes descendentes de sírios e libaneses, que ainda preservam a língua árabe inclusive nas missas, procuram a paróquia Nossa Senhora do Paraíso, em São Paulo. Essa é apenas uma das igrejas greco-católicas melquitas do país. O rito melquita, assim como o maronita, possui uma estrutura muito parecida com o rito da Igreja Católica Latina Romana (primeiro a liturgia e depois a oferenda), que tem suas raízes nos rituais da época de Constantinopla e que foram elaborados por São João Crisóstomo.
“Na Nossa Senhora do Paraíso, como temos uma comunidade árabe, fazemos a missa em grego, árabe e português duas vezes por semana.”, explica o padre sírio. “A missa é mantida assim por tradição, porque os imigrantes, especialmente os mais velhos, gostam de assistir a missa na língua que aprenderam quando crianças, sentem-se mais próximos. Também aparecem curiosos e fiéis de outras paróquias, que acham esse tipo de ritual interessante”.
Em um telão na igreja é projetada a transcrição das partes da cerimônia feitas em árabe e grego. A leitura do Evangelho é feita em árabe e português e as partes responsoriais, em que os fiéis respondem ao sacerdote, são feitas por um coral, em grego.
Em Guarinos, interior de Goiás, as missas e cerimônias como casamentos, são feitas ao som de música caipira, numa verdadeira “missa sertaneja”. Valdivino Borges Junior, conhecido como padre Junior Periquito é o responsável pela adaptação das cerimônias da Santa Sé.
“É uma celebração da missa como as outras. A diferença é que ela está carregada de elementos sertanejos e agropecuários”, explica o sacerdote que alia à batina, o chapéu de vaqueiro e um berrante. Devido ao sucesso das celebrações, reuniu uma banda de quatro músicos e gravou, no ano passado, o primeiro CD e DVD “Missa Sertaneja – Pe. Junior Periquito”. Ele diz que hoje recebe dois ou mais convites por mês e como muitos de seus encontros são itinerantes, o Padre Periquito mantém um blog e um perfil no Twitter para avisar os fiéis dos locais de reunião.
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