Êxodo do norte do Iraque reflete declínio de cristãos no país

Vítimas de intimidação e condições miseráveis, cristãos iraquianos sonham em deixar o país e até mesmo lugares tidos como refúgio, como o Curdistão
O número de cristãos que vivem no Iraque vem diminuindo cada vez mais. Expulsos de suas casas vítimas de ataques e intimidações, eles estão começando a abandonar os refúgios que haviam encontrado no norte do país, desanimados com a falta de oportunidades de trabalho e pelo medo de que a violência da qual haviam fugido possa estar mais próxima deles do que imaginavam.

O êxodo silencioso para a Turquia, Jordânia, Europa e Estados Unidos é o capítulo mais recente de um declínio aparentemente severo que muitos líderes religiosos dizem ser uma crise cristã em uma terra tão marcada por minaretes quanto por torres de sinos de igrejas. Avaliações feitas recentemente constaram que a população cristã do Iraque já diminuiu pela metade desde a invasão dos Estados Unidos em 2003 e, com a saída dos militares, alguns cristãos dizem ter perdido sua proteção.

Essa saída foi sentida em lugares como a aldeia de Tenna, que abrigou dezenas de migrantes cristãos ao decorrer dos últimos nove anos. As famílias que procuravam fugir dos esquadrões da morte e atentados de Bagdá encontraram um local mais seguro embaixo das gigantescas montanhas da região, mas também encontraram um ambiente tedioso, pobre e gelado. Os moradores estimam que metade das cerca de 50 casas de cristãos hoje estão vazias depois que suas famílias migraram para o exterior.

Walid Shamoon, 42 anos, quer ser o próximo a partir. Ele contou que deixou a capital do Iraque em janeiro de 2011 após ter sido confrontado por milicianos xiitas que o ameaçaram de morte e realizaram um atentado contra sua vida. Um de seus irmãos já havia sido morto em um ataque com morteiros, seis anos antes, então ele disse que largou o emprego que tinha na Embaixada da Austrália, onde recebia um salário de US$ 1,5 mil, e veio para Tenna.

Hoje em dia, a única coisa que ele consegue pensar é sobre sua inscrição para emigrar para o Arizona. "Não dá para viver assim", disse ele em uma tarde que uma tempestade de neve atingia as montanhas aonde vive. “A situação aqui não está melhorando, não há trabalho".



Condições

Os cristãos no norte do Iraque representam uma pequena fração das legiões de pessoas deslocadas do Iraque. Ao todo, são 1,3 milhão delas por todo o país, de acordo com as estimativas mais recentes da ONU. Muitos vivem em lixões, favelas e em condições miseráveis muito piores do que a situação de qualquer uma das famílias cristãs que habitam o Curdistão.

Ainda assim, os cristãos e outras minorias foram vítimas dos anos de limpeza sectária que praticamente fizeram com que Bagdá, antes uma cidade com uma boa diversidade étnica, se dividisse apenas entre sunitas e xiitas. As estimativas dos EUA e de organizações internacionais afirmam que a população cristã do Iraque, que antes da guerra estava entre 800 mil e 1,4 milhão de pessoas, agora é inferior a 500 mil.

"A consequência desse êxodo pode ser o fim do cristianismo no Iraque", afirmou a Comissão dos EUA sobre Liberdade Religiosa Internacional em seu relatório anual mais recente, resumindo as preocupações dos líderes da igreja.

Em janeiro, a Organização Internacional para as Migrações revelou que 850 de 1.350 famílias cristãs deslocadas que estão sendo acompanhadas por eles no norte do Iraque foram embora da região no ano passado. Muitos citaram medos sobre sua segurança, bem como dificuldades de encontrar trabalho, moradia e escolas em um local desconhecido onde conheciam poucas pessoas e só se fala árabe.

Mesmo na relativa segurança do Curdistão, alguns cristãos dizem que ainda vivem com medo. O sequestro de um empresário cristão em Erbil, a capital curda, e um recente surto de rebeliões e ataques incendiários contra lojas de bebida cujos donos eram cristãos na província de Dohuk - no norte do Iraque, ao longo da fronteira com a Turquia – impactaram profundamente impactou os cristãos da região.

Ainda assim, as autoridades curdas, que acolheram os cristãos na região se apressaram para acalmar os temores. O líder curdo, Massoud Barzani, visitou os cristãos em Zakho, a cidade onde os motins aconteceram e um desfile de autoridades governamentais e de líderes religiosos enfatizou a tolerância histórica do Curdistão, e os seus laços profundos com os assírios, caldeus e outros ramos do cristianismo.

"Eles fazem parte da nossa história", disse Omar Fadil, chefe do conselho provincial em Dohuk.



Governo

O governo curdo ofereceu terra, combustível gratuito e outras formas de assistência aos cristãos conforme eles chegavam de Bagdá, e abriu suas universidades para estudantes de Mossul, disseram as autoridades. E os cristãos não carecem de uma voz política. Eles se sentam em conselhos locais e provinciais por toda região norte além de terem assentos no Parlamento do Curdistão e de Bagdá.

Apesar da ajuda, muitas famílias disseram que estão tendo muitas dificuldades para sobreviver. Aqueles que moram próximos a cidades conseguem encontrar emprego, mas aqueles que moram em aldeias estão em grande parte desempregados e têm de viver com pensões do governo ou com uma ajuda de custo de cerca de US$ 200 por mês.

Eles não fazem algumas refeições e compartilham o combustível para se aquecer. Muitas vezes eles moram a quilômetros das escolas que ensinam árabe, e alguns pais dizem que seus filhos tiveram de abandonar as aulas.

“Costumávamos nos sentir a salvo no Curdistão, mas as coisas estão ficando instáveis. Não sabemos para onde ir”, disse Berkho Odeesho, prefeito do vilarejo de Dawudiyah.

Mas assim como muitos outros nesta região, Odeesho tem um plano. Ele pediu um visto de imigração e agora está ocupado se preparando para sua entrevista consular. Tirar sua família do Iraque pode ser um processo difícil, mas ele imagina um futuro melhor, longe do Iraque, em um lugar distante chamado Illinois.

Informações Jack Healy
The New York Times
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